Comprar ou alugar?

Devo comprar um imóvel próprio ou alugar? É uma questão que a maioria dos brasileiros já se deve ter feito e é uma pergunta recorrente nas finanças pessoais. A compra do lar próprio costuma ser uma das maiores decisão financeira da vida se não a maior.
O conteúdo é meramente informativo e não deve ser interpretado como conselho de investimento, análise ou recomendação.

A pergunta o que é mais vantajoso gera forte opiniões – especialmente entre familiares e amigos. O consenso costuma ser que a compra é mais rentável. A final quem compra deixa de pagar aluguel. Outros vão relembrar o boom imobiliário que viu os imóveis se valorizar 30% ou mais no ano. Mas, a final, o que foi mais vantajoso? E, qual é a expectativa de valorização de um imóvel?  

O desafio ao analisar um investimento no mercado imobiliário é a ausência de dados. Não é possível obter o retorno de todos os imóveis no Brasil e ainda menos no mundo. Dependemos de aproximações ao analisar o retorno histórico dos imóveis.  

Felizmente, a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) providencia dados históricos sobre o preço dos imóveis dos grandes centros urbanos no Brasil. Os dados são obtidos através de portais de anúncios na internet como Zap Imóveis. Porém, não é possível verificar pelo quais valores os imóveis efetivamente foram vendidos. O índice leva em consideração o valor pedido pelo imóvel e não o valor da venda, mas, o índice gera uma aproximação.  

Uma crítica ao índice é que imóveis que não voltam ao mercado por questões de degradação ou desuso da área não são contemplados. Por tanto, o índice apresenta um viés de sobrevivência. Imóveis que perderam o seu valor e foram destruídos para recuperar o terreno não entram no índice. Para verificar a metodologia completa do índice, visite o site da FIPEZAP.  

De 2008 a 2011 somente foram analisados anúncios nas cidades de Rio de Janeiro e São Paulo. A partir de 2011 a abrangência do índice aumentou e hoje contempla mais de 30 cidades em todo o Brasil. Para fins de comparação vamos utilizar o Índice FIPEZAP do valor de venda de imóveis residenciais. Fazendo uma primeira análise é possível verificar que investir em um imóvel protegeu da inflação.  

Line Chart Example

Gráfico I - Valorização FIPEZAP_RES_VEN contra INCC, IPCA e IGPM.

Embora vendido pela indústria de construção como seguros e eternos, imóveis precisam de cuidados. Não é possível manter o valor de um imóvel sem investir em pequenas reformas e a manutenção. Incluir um custo de 0,5% ao ano do valor do imóvel para esse fim já aproxima consideravelmente a valorização dos imóveis a inflação. Se o custo de manutenção for maior que 0,5% ao ano – o que é factível para imóveis mais antigos ou casas – não foi possível manter o poder de compra. Ou seja, a valorização do imóvel após custos ficou abaixo da inflação.  

Gráfico II - Valorização ajustada FIPEZAP_RES_VEN contra INCC, IPCA e IGPM.

Mas, quem investe em imóveis não investe somente pela possível valorização. O aluguel forma um componente importante do retorno de um investimento em imóveis. Deste o início do índice FIPEZAP o aluguel gerou em torno de 4,5% a 8% ao ano sobre o valor do imóvel. No momento em que este artigo está sendo escrito – agosto de 2023 – a média nacional do rendimento do aluguel sobre o valor do imóvel está em 5,5% ao ano.  

Para fins desta análise vamos usar 6% ao ano sobre o valor do imóvel como referência para o valor do aluguel. Um problema em relação ao aluguel é que não é possível comprar um imóvel fracionado – pelo menos não no mercado de imóveis tradicional. Mesmo assim, vamos assumir de que é possível reinvestir integralmente o aluguel em novos imóveis.  

Outros custos que precisam ser considerados ao investir em imóveis são a vacância, inadimplência, custos com a imobiliária e corretagem e tributos.

Quem aluga sabe que nem todos os inquilinos pagam devidamente o seu aluguel e nem sempre é possível manter o imóvel ocupado. Além disso, rotatividade custa. Quanto mais é necessário buscar um inquilino, mais dinheiro é gasto com corretores e menos dinheiro entra devido a vacância. Para fins desta análise foi incluído um custo de um aluguel por ano.  

Em relação a corretagem, vamos desconsiderar o valor para fins desta análise. É possível não depender de corretores para a venda mesmo que seja mais comum. O mesmo vale para o tributo sobre o ganho de capital sobre o lucro imobiliário, já que é a legislação permite descontos consideráveis.  

Mesmo assim, como de costume no Brasil, o maior custo é imposto pelo estado através de tributação. Considerando que o imóvel é mantido em nome de uma pessoa invés de uma empresa, o aluguel é tributado em até 27,5% e ao comprar um imóvel incide o tributo ITBI – Imposto de Transferência de Bens Imóveis. Cada município pode definir o percentual que cobra de ITBI limitado a 5% do valor da transação. Para fins desta análise foi usado um ITBI de 2% sobre o valor do imóvel e um tributo de 20% sobre o valor do aluguel.  

Como tudo isso vamos aos resultados.  

Gráfico III - Valorização ajustada FIPEZAP_RES_VEN contra IMAB5+ ajustado

A cada R$ 100,00 investidos em imóveis viraram R$ 496,20 deste a janeiro de 2008. Corrigindo o valor somente pela inflação, R$ 100,00 em janeiro de 2008 equivalem 15 anos depois R$ 236,96 (corrigidos pelo IPCA) ou R$ 307,23 (corrigidos pelo IGPM).  

Ou seja, o investidor em imóveis conseguiu aumentar o seu patrimônio. Mas, a pergunta é, um resultado parecido poderia ter sido alcançado com um investimento simples? A resposta é sim. Investindo em uma NTNB de longo prazo, ou seja, um título público indexado a inflação, o resultado foi parecido.  

O índice IMAB5+ que representa a rentabilidade de títulos públicos gerou um resultado expressivo. Incluindo custos de 0,25% ao ano para um fundo ou ETF e uma tributação de 15% sobre o ganho o resultado líquido acaba sendo parecido. R$ 100,00 no mesmo período viraram R$ 480,06. O valo é quase igual! E, sem preocupação com inquilinos, trabalho com a busca do imóvel perfeito e assim por diante.  

E ainda mais, tudo isso sem considerar tributos sobre o ganho de capital na venda do imóvel e a corretagem! Incluindo esses custos, o rendimento da média dos imóveis certamente teria ficado atrás de uma simples aplicação na renda fixa brasileira.  

Investir em imóveis pode gerar riqueza? Sim! Mas, é necessário ter um processo de investimentos, diligência e muitas vezes contatos com pessoas atuando no ramo como corretores e engenheiros civis. Quem não disponibiliza o tempo necessário não pode esperar retornos extraordinários e muitas vezes, acaba sendo mais bem servido com a renda fixa.  

Tendo discutido o aspecto econômico da compra do imóvel próprio, é importante ressaltar que comprar um imóvel não é somente uma forma de investir. Chamar um imóvel de seu traz uma série de benefícios imateriais. Dinheiro é somente uma ferramenta para viabilizar os nossos projetos. Não deveria ser buscado a maximização do valor na conta bancária a qualquer custo. O importante é o dinheiro foi gasto de uma forma que gerou mais qualidade de vida.  

Ao seguir outras considerações - tantas positivas quanto negativas – que devem ser analisados antes da compra de um imóvel:  

Financiar força poupar

O melhor argumenta para a compra de um imóvel é a poupança forçada via um contrato de financiamento. Comprar um imóvel financiado gera a obrigação de poupar dinheiro. Isso é um fator fundamental. Poupar dinheiro para um futuro distante é contra a nossa natureza. Após ter trabalhado duro queremos usufruir invés de poupar. Um financiamento pode ser visto como um contrato de poupança com um terceiro. E, não honrar o compromisso não é uma opção. Quem se nega a pagar o financiamento acaba perdendo o imóvel.  

Ao mesmo tempo, o dinheiro poupado não é facilmente acessível. Para acessar o valor seria necessário vender o imóvel. Contrário ao quem aluga e investe o dinheiro no mercado financeiro. É fácil fazer o resgate e gastar o dinheiro com uma viagem, um carro novo ou qualquer outro prazer. Quem sofre com disciplina na sua vida financeira definitivamente deveria analisar se a compra do imóvel próprio possa fazer sentido.  

Prestígio Social

Poder chamar um imóvel de seu gera prestígio social – independente de qual porcentagem pertence ao banco. A compra de um imóvel é parabenizada pelos familiares, amigos e colegas. Curiosamente o pagamento do financiamento carrega menos estigma comparado com o pagamento do aluguel. A diferença entre os dois é mínimo. O banco é compensado pelo uso do dinheiro e o locatário pelo uso do imóvel.  

Dinheiro e aplicações financeiras são mais abstratos comparado com um imóvel. Não é possível visitar a sua carteira de investimentos ou convidar amigos para conhecer. Quem investe no mercado financeiro muitas vezes se depara com o conselho de resgatar o dinheiro e comprar um imóvel. Um outro ponto interessante, muitas vezes proprietários de imóveis se sentem mais ricos independentemente do valor na conta.  

Flexibilidade para reformas

Quem determina o que acontece com o imóvel é o proprietário. O imóvel pode ser adequado as suas próprias ideais e necessidade. É indiscutível que isso gera qualidade de vida. Mas, vale lembrar que o inquilino sempre tem a opção de discutir adaptações as suas necessidades. Caso não seja possível, sempre pode ser encontrado um outro imóvel, ainda mais nas grandes metrópoles como São Paulo.  

Risco

Contra a consenso popular, comprar um imóvel tem riscos significativos – ainda mais fora dos grandes centros urbanos. A falta de diversificação é gritante. Quem compra tem uma parcela relevante do seu patrimônio atrelado ao desempenho de um único bem. A concentração gera ótimos resultados para alguns e desastrosos para outros. O ditado popular de que não se deve colocar todos os seus ovos no mesmo sexto é aplicável. Uma carteira de investimentos diversificado é composto por ações internacionais, ações brasileiras, renda fixa e até imóveis através de fundos imobiliários no Brasil ou Real Estate Trusts (REITs) no exterior. É ingênuo acreditar que o valor do imóvel é isento de riscos e não possa sofrer de uma desvalorização.  

Flexibilidade

Quem aluga é flexível. Quem compra é limitado pela localização do seu imóvel. Sim, é possível vender o imóvel ou alugar para um terceiro, mas, isso gera custos e uma série de outros problemas. Na prática e comprovado de que pessoa que moram no imóvel próprio tem uma disposição menor de si mudar. A inflexibilidade gera custos de oportunidade que nem sempre são considerados ao comprar um imóvel. A carreira pode sofrer devida a indisposição de mudança, o trajeto para o trabalho pode ser mais longo e estressante e oportunidades de negócios ou empreendedorismo são recusados devida a falta de capital disponível. Além disso, a vida traz mudanças naturais. Filhos saem da casa ou uma relação termina, porém o espaço comprado para acomodar todos permanece. Quem aluga tem mais facilidade de se adequar as circunstâncias da vida.

Propriedade obriga

O proprietário do imóvel é responsável por manter o seu patrimônio em condição habitáveis. Muitas vezes pensamos que imóveis são permanentes, mas, como tudo imóveis tem uma vida útil. Embora isso seja um aspecto menos relevante para imóveis recém-construídos, o trabalho com a manutenção não possa ser menosprezado.

Conclusão

Ao comprar a pergunta que precisa respondido é, é um investimento ou é um desejo, ou seja, eu quero usufruir esse imóvel?  

Se a compra é voltada para o investimento, não faz sentido investir (para a maioria das pessoas) através de um único imóvel. Custos de transação, ausência de diversificação, risco de vacância e o trabalho de achar um objeto adequado para investir tornam a compra de um imóvel único pouco prático. É mais fácil comprar fundos imobiliários ou mesmo, investir em uma carteira diversificada. Mas, no Brasil, a taxas de juros subsidiados para a compra de imóveis as vezes torna a compra viável como investimento. De qualquer forma, a compra financiada torna aumento o risco. Cabe ao investidor fazer uma análise fria dos números.  

Se a compra for para usufruir o imóvel com a família e os amigos ou mesmo sozinho, que compre o imóvel! Dinheiro é uma ferramenta para melhorar as nossas vidas. Nem tudo precisa ser um investimento.  

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